Os principais pontos para entender o que muda com a reforma tributária
Com a aprovação em dois turnos pela Câmara da proposta de emenda à Constituição (PEC) 45/2019, que reforma o sistema tributário brasileiro, o texto agora precisa ser aprovado no Senado para poder ser promulgado.
Apoiadas pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), as modificações previstas na proposta têm o objetivo de simplificar a legislação tributária, eliminando distorções. Trata-se da primeira grande mudança no modelo de cobrança de impostos sobre consumo do país desde a década de 1960.
A PEC estabelece as regras gerais para um novo modelo de tributação, mas ainda há detalhes, como as alíquotas dos novos impostos, que precisam ser regulamentadas por meio de lei complementar.
Confira a seguir alguns dos principais pontos para entender a reforma aprovada na Câmara.
Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual
O eixo principal da reforma de tributos sobre consumo é a criação do sistema de Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual. Passam a vigorar o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) no lugar do ICMS estadual e do ISS municipal; e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que substitui três tributos federais: PIS, Cofins e IPI.
Não cumulatividade e cobrança no destino
Os impostos obedecem aos princípios de não cumulatividade, ou seja, de cobrança em uma única etapa da cadeia de produção, e de recolhimento no local de destino, de modo a acabar com a “guerra fiscal” entre estados. A legislação passa a ser única para todo o país, com mesmo fator gerador, acabando com as milhares de leis que regem os impostos em cada município e cada unidade federativa.
Três alíquotas diferentes
O texto aprovado na Câmara prevê uma alíquota padrão, como regra geral, que valerá para a maior parte dos bens e serviços; e uma reduzida em 60% para determinados setores, como saúde, educação, dispositivos médicos, transporte coletivo, produtos agropecuários, alimentos, produtos de higiene pessoal, além de produções artísticas, culturais, jornalísticas e audiovisuais.
Por fim, terão alíquota zero alguns tipos de dispositivos médicos e medicamentos, como os utilizados no tratamento de câncer, itens da cesta básica, serviços de educação nos termos do Programa Universidade para Todos (Prouni) e produtores rurais pessoa física. Os percentuais serão definidos por lei complementar.
Regimes específicos
Há ainda a previsão de regimes especiais de tributação para determinados setores. Combustíveis e lubrificantes terão incidência do imposto uma única vez, qualquer que seja a sua finalidade. Poderá haver alíquotas diferenciadas por produto, mas elas deverão ser uniformes em todo o país.
Outros setores que terão tributação diferenciada incluem serviços financeiros, operações com bens imóveis, planos de assistência à saúde e concursos de prognósticos; operações contratadas pela administração pública direta, por autarquias e por fundações públicas; sociedades cooperativas; e serviços de hotelaria, parques de diversão e parques temáticos, restaurantes e aviação regional.
Imposto seletivo
Outro tributo que será criado caso a PEC seja aprovada também no Senado é o Imposto Seletivo, de natureza extrafiscal e voltado a desestimular o consumo de determinados produtos ou serviços considerados prejudiciais ao meio ambiente ou à saúde, como cigarros e bebidas alcoólicas. O rol de produtos que devem ser sobretaxados deve ser definido por lei complementar.
Cashback
A PEC abre a possibilidade de devolução a pessoas físicas de parte do imposto pago “com o objetivo de reduzir as desigualdades de renda”. As hipóteses do chamado “cashback”, além dos limites e dos beneficiários, ainda devem estabelecidas por meio de lei complementar.
Fundo de Desenvolvimento Regional
Um Fundo de Desenvolvimento Regional será criado com o objetivo de reduzir desigualdades regionais e sociais com a entrega de recursos da União para as unidades federativas para “realização de estudos, projetos e obras de infraestrutura; fomento a atividades produtivas com elevado potencial de geração de emprego e renda, incluindo a concessão de subvenções econômicas e financeiras; e promoção de ações com vistas ao desenvolvimento científico e tecnológico e à inovação.”
O valor da verba que a União destinará será fixado em lei
complementar, mas o Ministério da Fazenda se comprometeu a repassar R$ 40
bilhões ao fundo.
Conselho Federativo
A PEC prevê ainda a criação de um Conselho Federativo, colegiado
responsável por fazer a gestão do IBS. Conforme o texto, o órgão será uma
entidade pública sob regime especial, dotada de independência técnica,
administrativa, orçamentária e financeira, que fará a administração
compartilhada do imposto.
Estados e Distrito Federal terão 27 membros, um para cada
ente federado, enquanto os municípios terão outros 27 membros, 14 eleitos com
base nos votos igualitários e 14 com base nos votos ponderados pelas
respectivas legislações.
Prazo de transição
Conforme a versão aprovada na Câmara, a transição dos atuais impostos para os IVAs nacional (CBS) e subnacional (IBS) começará ao mesmo tempo, em 2026, com alíquotas de 0,9% no caso do tributo federal e de 0,1% no imposto subnacional.
Os valores arrecadados com o IBS serão utilizados em um primeiro momento para custear o Conselho Federativo, que administrará o tributo dos estados e municípios, além de compor um fundo para compensar benefícios fiscais de ICMS.
A CBS deve substituir totalmente os impostos indiretos federais já em 2027, quando passam a ser zeradas as alíquotas de IPI, com exceção do que incide sobre produtos fabricados na Zona Franca de Manaus, de modo a manter sua competitividade.
O IBS permanece com alíquota teste até 2028. De 2029 e 2032, o IVA subnacional passa a substituir ICMS e ISS na proporção de 1/10 a mais por ano. A partir de 2033, os tributos indiretos de estados e municípios passam a ser integralmente substituídos pelo novo imposto.
IPVA sobre embarcações e aeronaves
Embora a PEC aprovada esteja centrada na reforma dos impostos sobre consumo, o texto prevê alguns dispositivos que alteram a tributação sobre patrimônio. Uma das mudanças, por exemplo, permite que estados possam cobrar alíquotas progressivas do IPVA em razão do impacto ambiental de veículos.
Outro dispositivo inclui veículos aquáticos e aéreos entre
os veículos sobre os quais incidirá o IPVA, o que faz com que proprietários de
embarcações e aeronaves passem a recolher o imposto como ocorre com os donos de
automóveis. Ficam excetuadas do tributo, no entanto, aeronaves agrícolas e
embarcações voltadas a transporte aquaviário ou de pesca industrial, artesanal,
científica ou de subsistência.
Atualização do IPTU por decreto
Já em relação ao IPTU, cobrado por municípios, a atualização
da base de cálculo poderá ser feita por meio de decreto, a partir de critérios
gerais previstos em lei municipal. Hoje os reajustes precisam necessariamente
passar pelo crivo do Legislativo para entrar em vigor.
Imposto sobre herança
A reforma também dispõe sobre mudanças no Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), de responsabilidade dos estados. Hoje, cada unidade federativa pode instituir sua alíquota, com o limite de 8%, e a possibilidade de isenção do imposto. A PEC prevê que o tributo seja progressivo de acordo com o valor da herança ou doação transmitida, como já ocorre em alguns estados, como o Rio de Janeiro. O recolhimento será feito no estado de residência da pessoa falecida.
Manutenção de carga tributária
O texto estabelece que “as alíquotas de referência serão revisadas anualmente”, “visando à manutenção da carga tributária”. O dispositivo foi incluído pelo relator da matéria para garantir o princípio da neutralidade, ou seja, de que não haverá aumento de carga tributária. No ano passado, segundo a Secretaria do Tesouro, o peso dos impostos, considerando os níveis federal, estadual e municipal, foi de 33,71% do PIB. Os critérios para a revisão anual das alíquotas serão definidos por lei complementar.