A última tentação do ano
E quando, diferentemente da Black Friday, uma data “obriga” a aquisição de presentes, para si e/ou para os outros? Bem, o Natal é semana que vem, última prova de resistência aos apelos consumistas do ano
A Black Friday pode não ter sido um sucesso para os comerciantes, mas para alguns consumidores, sim. Graças a boas aquisições realizadas na temporada de promoções? Nada disso. Aliás, justamente pelo contrário. Para aqueles que sofrem de compulsão por compras, a data costuma provocar ansiedade e funcionar como gatilho para comportamentos evitados com muito esforço no restante do ano. Superá-la ileso constitui uma vitória. Mas, afinal, o que é o consumo compulsivo? Resumidamente, é a recorrência de aquisições não planejadas e marcadas pela sensação de urgência. É considerado patológico quando causa prejuízos ao próprio indivíduo ou a quem o cerca, e nessa categoria está de 1% a 6% da população mundial. Quando não patológico, o impulso de comprar não causa necessariamente danos a si e atinge surpreendentes 25% da população. De 85% a 95% das pessoas afetadas são mulheres.
Há basicamente dois tipos de compulsivos. Existem aqueles que buscam engrandecer a própria imagem, de modo a serem vistos como bem-sucedidos, e por isso investem em coisas caras e que poderão exibir publicamente, e há os viciados em barganhas, caçando sempre a melhor oferta. Para estes últimos, uma sexta-feira inteira (ou uma semana, ou um mês) de promoções, como a Black Friday, é um verdadeiro desafio a qualquer tratamento. Longe de se satisfazerem com o que adquirem, compulsivos quase sempre se frustram depois de comprar, pois o prazer se esvai rapidamente, gerando vergonha e culpa. A graça está no processo de aquisição, e não no objeto em si. A felicidade reside em pensar antecipadamente na compra, e é este pensamento que condiciona variações de humor.
Em momentos “pra baixo”, comprar aparece como a maneira mais simples, rápida e eficaz de reverter o estado de ânimo. Se isso coincide com uma circulada no shopping, uma promo online ou as ofertas da semana do supermercado, é grande a tentação. A compulsão está ligada à privação na infância e à incapacidade de lidar com sentimentos negativos. A baixa autoestima alimenta o impulso e torna aqueles a quem acomete mais materialistas, ou seja, apegados a bens e dinheiro, aos quais costumam conferir grande importância. Comprar é apenas uma das formas de canalizar suas frustrações; alguns também abusam de álcool, drogas e comida. E quando, diferentemente da Black Friday, uma data “obriga” a aquisição de presentes, para si e/ou para os outros? Bem, o Natal é semana que vem, última prova de resistência aos apelos consumistas do ano.
Boas Festas.