Como se comportou a economia na “largada” dos governos neste século



O bom momento da agropecuária ajudou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a começar o mandato com um crescimento de 1,9% no Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre. Foi o melhor número para um início de gestão presidencial neste século.

Um olhar mais atento aos demais dados, porém, revela que o desempenho exuberante do campo foi exceção. Outras áreas passam por dificuldades.

Confira a seguir como foi o desempenho da economia brasileira nos primeiros trimestres de cada governo neste século.

2003, Lula 1: juro nas alturas e tempos de incerteza

A desconfiança em relação ao que poderia ser o governo Lula deixou o mercado apreensivo na campanha eleitoral de 2002. O dólar chegou a bater na marca dos R$ 4 em outubro. Na época, porém, o Brasil não tinha tantas reservas internacionais para fazer frente à saída de recursos. Naquela época eram US$ 54,4 bilhões. Hoje, são US$ 345,7 bilhões, de acordo com o dado mais recente do Banco Central, de abril.

O impacto da forte desvalorização cambial foi sentido nos preços. Em março de 2023, três meses após a posse de Lula, a inflação acumulada em 12 meses estava em 16,57%, segundo dados do IBGE.

Duas alternativas foram usadas na época: o estabelecimento de um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e taxas elevadas de juros, na tentativa de reduzir a inflação e desaquecer a atividade econômica. A Selic estava em 26,5% no fim do primeiro trimestre de 2003, até hoje a maior em um início de governo neste século.

O resultado foi uma queda de 0,3% do PIB em relação ao último trimestre de 2002. A agropecuária foi o único setor que cresceu na ocasião. A indústria teve forte retração de 5%. E os serviços encolheram 0,5% em relação ao trimestre anterior. Houve reflexos sobre o investimento privado, que encolheu 2,8% em relação ao último trimestre de 2002.

A taxa de desemprego ao fim de março de 2003 era de 12,7% nas seis regiões metropolitanas que à época eram monitoradas pelo IBGE. Ao longo do trimestre, foram gerados 140,8 mil postos de trabalho com carteira assinada, um saldo que, neste século, só foi melhor que o do primeiro trimestre de Dilma 2, quando foram fechadas 64,9 mil vagas.

2007, Lula 2: surfando no ciclo das commodities

Em 2007, início do governo Lula 2, o Brasil surfava na onda do ciclo das commodities, e os primeiros sinais daquela que seria a maior crise econômica mundial em 80 anos apenas começavam a aparecer nos Estados Unidos.

A taxa Selic estava bem abaixo dos níveis de quatro anos antes: 12,75% ao ano. A inflação medida pelo IPCA fechou os 12 meses encerrados em março em 2,96%, o número mais baixo para os três primeiros meses de um governo neste século.

Os reflexos dessa melhor situação econômica foram sentidos nos resultados do PIB do primeiro trimestre. A economia cresceu 1,8%, puxada pelo setor de serviços (2,6%). O consumo familiar (alta de 2,5%) e o investimento privado (4,7%) tiveram os melhores desempenhos para os três primeiros meses de um mandato presidencial desde o começo do século.

O desemprego nas regiões metropolitanas, porém, ainda era elevado: 12%, de acordo com o IBGE. No mercado formal, as empresas criaram quase 400 mil postos de trabalho nos três primeiros meses do ano, 183% a mais do que no início da gestão anterior.

2011, Dilma 1: na onda da recuperação

O Brasil vinha de um forte crescimento da economia em 2010, quando o PIB avançou 7,5% no embalo da recuperação da crise financeira global – entre 2008 e 2009, o mundo enfrentou a recessão provocada pelo estouro das hipotecas subprime dos EUA.

No primeiro trimestre do governo de Dilma Rousseff (PT), o PIB cresceu 1,5% em relação ao anterior, com os três grandes setores – agropecuária, indústria e serviços – avançando.

O desemprego nas regiões metropolitanas estava em 7,6% e as empresas criaram 525,6 mil empregos com carteira assinada nos três primeiros meses do ano, até hoje um recorde para começo de mandato.

O consumo das famílias cresceu 1,4% e o investimento produtivo, 2,6%. Foi a última vez que o investimento produtivo cresceu num início de gestão presidencial.

2015, Dilma 2: o começo de uma profunda recessão

No começo de 2015, após a apertada reeleição de Dilma, os bons momentos da economia eram coisa do passado. Manifestações políticas tomavam conta do país, e as incertezas levaram a inflação acumulada em 12 meses para 8,13%.

Apesar de a taxa de desemprego estar em patamares relativamente baixos – de 8% na média nacional nos três primeiros meses de 2015 –, quase todos os outros indicadores da economia exibiam o que seria o prenúncio de uma profunda recessão, que duraria até o fim do ano seguinte.

Sem confiança, o setor produtivo entrou em compasso de espera fechou 64,9 mil postos de trabalho com carteira assinada entre janeiro e março, o pior saldo do emprego formal em um início de mandato neste século.

As famílias adiavam as compras. O consumo encolheu 1% em relação aos três meses anteriores. Com empresas adiando desembolsos, outro termômetro da economia, o investimento produtivo, experimentava uma queda de 3%. Indústria e serviços também encolheram, contribuindo para uma queda de 0,8% do PIB no primeiro trimestre – o pior resultado para um início de governo no período analisado.

A inflação também dava sinais de alta: foi de 8,13% no acumulado de 12 meses até março, maior patamar para um começo de mandato desde 2007.

2019, Bolsonaro: crescimento tímido

Nos três primeiros meses do governo Jair Bolsonaro (PL), a economia brasileira teve desempenho muito superior ao do início da gestão Dilma 2. Ainda assim, os números do começo de 2019 foram, na maioria dos casos, fracos.

O PIB cresceu 0,3% em relação ao último trimestre de 2018. Só um dos três setores de atividade econômica teve crescimento, o de serviços (0,8%). Indústria e agropecuária encolheram.

O consumo familiar foi o propulsor da economia sob a ótica da despesa. Avançou 1,9%, influenciado também pela inflação mais comportada, de 4,58% no acumulado de 12 meses até março.

Outros indicadores, entretanto, ainda mostravam sinais de cautela, principalmente entre os empresários: o investimento produtivo encolheu 1,1% em relação ao trimestre anterior, mesmo com a Selic relativamente comportada, em 6,5% ao ano.

Entre janeiro e março foram criadas 164,2 mil oportunidades de trabalho com carteira assinada. O desemprego estava elevado, em 12,8% ao fim daquele trimestre.

2023, Lula 3: salvação da economia foi o agro

A supersafra – de quase 316 milhões de toneladas, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento – foi um alento para os números do PIB do primeiro trimestre de 2023.

A indústria ficou estagnada, o que não chega a surpreender em meio ao histórico de retração do setor nas últimas décadas. O crescimento trimestral de 0,6% dos serviços, maior setor da economia, ficou abaixo do observado no início do segundo mandato de Lula, no primeiro de Dilma e no começo da gestão de Bolsonaro.

O avanço do consumo das famílias, de apenas 0,2%, só foi melhor que o do começo da segunda gestão de Dilma, marcada pela forte recessão que fez a economia brasileira encolher quase 7% em apenas dois anos. O investimento produtivo, enquanto isso, baixou 3,4% no começo de 2023 – a maior queda para um início de governo desde o início do século.

Os dados do emprego são ambíguos. A taxa de desocupação aumentou nos três primeiros meses do ano e, embora menor que a do início do governo Bolsonaro, supera a verificada nos primeiros trimestres de 2011 e 2015. A geração de empregos formais, por sua vez, está em desaceleração pelo segundo ano consecutivo, mas ainda está entre as melhores para inícios de governo.

A inflação até março, ainda que em desaceleração, superou a do começo da gestão Bolsonaro. O remédio para conter os preços, a taxa de juros, é uma das maiores do período analisado: em 13,75% ao ano, a taxa Selic só não é maior que a do começo da gestão Lula 1, quando esteve em estratosféricos 26,5% ao ano.

“A desaceleração da atividade econômica em 2023 é reflexo dos efeitos defasados do aumento da taxa Selic”, apontam analistas do Bradesco.

A inadimplência e o comprometimento de renda são elevados. Segundo o Banco Central, em março o endividamento das famílias com o sistema financeiro nacional chegava a 48,51% da renda acumulada nos últimos 12 meses – o indicador supera 48% desde outubro de 2021.

De acordo com a Serasa Experian, em abril 71,4 milhões de brasileiros – 43,8% da população adulta – tinham restrições ao crédito.

As expectativas são que, daqui para a frente, a atividade econômica dê passos mais tímidos, inclusive com a possibilidade de recuo no segundo trimestre, apontam analistas do Bradesco.

Porém, espera-se que 2023 feche no azul. O mercado financeiro está revisando para cima as projeções de crescimento para este ano – a mediana das expectativas chegou a 1,84%, ante 1,02% há quatro semanas.



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