Governo deve R$ 549 milhões a órgãos internacionais, mas nega atraso



O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem uma dívida de R$ 549,1 milhões em contribuições e integralizações a órgãos e instituições financeiras internacionais para ser paga até o final deste ano, de acordo com dados fornecidos pelo Ministério do Planejamento e Orçamento (MPO) através da Lei de Acesso à Informação (LAI).

Os dados foram divulgados nesta semana pelo projeto independente Fiquem Sabendo e confirmados pela Gazeta do Povo junto ao MPO e ao Ministério das Relações Exteriores, e apontam que há valores em aberto, outros quitados e ainda parcelas que estão previstas para serem pagas até o final deste ano.

“Os débitos não estão atrasados, são referentes a contribuições e integralizações do corrente ano de 2024. […] A existência de débitos ainda não pagos ocorre porque existe um processo para apuração e verificação de valores e posterior pagamento”, disse o MPO à reportagem.

De acordo com os dados apurados através da LAI junto ao MPO, e fornecidos no começo do mês de agosto, a dívida do Brasil com 20 órgãos internacionais era de R$ 771,7 milhões. O valor, no entanto, foi reduzido para R$ 549,1 milhões nesta semana devido à variação cambial – o dólar teve uma redução de R$ 0,14 no período, entre outras moedas – e pagamentos realizados.

O Itamaraty informou à reportagem que os pagamentos são feitos pelo MPO em coordenação com a pasta, e que vem realizando esforços para a “quitação das obrigações financeiras do Brasil, com amplos avanços no quadro de adimplência desde o ano passado”.

“A distribuição dos pagamentos ao longo do ano atende a variadas condicionantes, tais como fornecimento da documentação necessária por parte do organismo, disponibilidade de recursos financeiros e diferentes critérios de priorização, em coordenação com o Itamaraty”, disse.

Entre os débitos ainda em aberto está a contribuição brasileira ao Tribunal Penal Internacional (TPI), do qual o país é signatário desde 2002, e somava R$ 43,3 milhões quando o pedido de informações foi concluído. Este é o maior entre as contribuições do governo com organismos estrangeiros, e que o MPO afirma já ter quitado a maior parte.

“Em decorrência da variação cambial o orçamento previsto ficou ligeiramente insuficiente, mas já foi feito pagamento parcial em 21/08/2024, no valor de EUR 6.802.984,59 (R$ 41,4 milhões na cotação do dia informado), estando em curso um remanejamento para pagamento do saldo de EUR 959.089,51 (R$ 5,9 milhões na cotação da última quarta, 10, quando respondeu à reportagem) a partir de cancelamento do saldo de despesas já quitadas”, disse o MPO.

O segundo maior débito apurado no levantamento foi com a FAO, órgão da Organização das Nações Unidas (ONU) voltado à alimentação e agricultura constantemente citado pelo presidente Lula como referência no combate à fome. O saldo no começo de agosto era de R$ 25 milhões que, diz o MPO, “foi integralmente quitado em 20/08/2024”.

“Com relação aos dois organismos citados, cumpre registrar que o MPO informou, no final de agosto, ter quitado as contribuições à FAO, bem como saldado a quase totalidade das contribuições ao TPI”, emendou o Itamaraty.

Fundos milionários

Ao todo, a conta do Brasil com estes organismos internacionais é composta por R$ 22.681.994,26 em contribuições e R$ 526.464.333,87 em integralizações de instituições financeiras multilaterais, segundo informou o MPO.

As integralizações pendentes – participação em cotas – correspondem à maior parte dos débitos e estão concentradas em apenas duas instituições multilaterais: a Corporação Andina de Fomento (CAF) e o Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata (FONPLATA), de acordo com os dados do ministério apurados no começo de agosto.

Apenas no CAF, que é um banco de desenvolvimento composto por 20 países da América Latina e Europa, a conta é de R$ 504,8 milhões.

Já o FONPLATA é um fundo financeiro também de desenvolvimento voltado à região da bacia do rio da Prata, composto pelo Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia. O débito brasileiro com este fundo era de R$ 158,3 milhões quando o levantamento foi concluído.

Embora sejam valores vultuosos, o MPO informou à Gazeta do Povo que estes pagamentos “não são regulares”.

Veja abaixo todos os órgãos internacionais que o Brasil tem contribuições e integralizações e os valores apurados e convertidos para o Real no dia 2 de agosto, data em que o acesso aos dados foi concedido:

Contribuições:

  • Organização Internacional do Café (OIC) – R$ 3,2 milhões;
  • Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) – R$ 503,3 mil;
  • Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) – R$ 25 milhões;
  • Contribuição à União Postal Universal (UPU) – R$ 887,5 mil;
  • Organização Internacional da Juventude (OIJ) – R$ 2,9 milhões;
  • Tribunal Internacional do Direito do Mar (TIDM) – R$ 1,9 milhão;
  • Parlamento do Mercosul (PARLASUL) – R$ 7,2 milhões;
  • Organização Mundial de Turismo (OMT) – R$ 1,4 milhão;
  • Convenção para a Conservação de Espécies Migratórias de Animais Selvagens (CMS) – R$ 2,6 milhões;
  • União Geodésica e Geofisica Internacional (UGGI) – R$ 83,2 mil;
  • Centro Latino-Americano de Física (CLAF) – R$ 344,1 mil;
  • Acordo de Conservação de Albatrozes e Petréis (ACAP) – R$ 3,48,4 mil;
  • Contribuição ao Protocolo de Nagoia sobre Acesso a Recursos Genéticos – R$ 573,1 mil;
  • Comissão Internacional para a Conservação do Atum e Afins do Atlântico (ICCAT) – R$ 2,3 milhões;
  • Organização Mundial das Aduanas (OMA) – R$ 1,4 milhão;
  • Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (UNIDO) – R$ 13,9 milhões;
  • Tribunal Penal Internacional (TPI) – R$ 43,3 milhões;
  • Contribuição ao Tratado sobre o Comércio de Armas (TCA) – R$ 156,2 mil;

Integralizações:

  • Corporação Andina de Fomento (CAF) – R$ 504,8 milhões;
  • Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata (FONPLATA) – R$ 158,3 milhões.

Os valores foram calculados em cima de cinco moedas de acordo com a sede/origem do órgão: Dólar dos Estados Unidos (R$ 5,73), Libra Esterlina (R$ 7,33), Euro (R$ 6,26), Franco Suíço (R$ 6,67) e Dólar Australiano (R$ 3,73).

Valores escapam dos bloqueios

Embora outros ministérios do governo estejam passando por bloqueios orçamentários determinados pela equipe econômica, estes pagamentos são pouco afetados pela medida, segundo informou o MPO.

“Somente uma parcela dos pagamentos é de despesas discricionárias (contribuições não regulares, como as integralizações de organismos financeiros, que não ocorrem todos os anos) e, portanto, somente uma parte, menor, foi afetada pelos contingenciamentos e bloqueios orçamentários realizados pelo governo neste ano, de modo que poderão demandar discussão e/ou reavaliação até o final do ano”, disse.

A pasta afirma que mesmo para as despesas discricionárias, já havia previsão orçamentária correspondente na Lei Orçamentária Anual de 2024.

O ministério afirmou, ainda, que vem fazendo um “grande esforço” para regularizar os pagamentos da participação brasileira em órgãos internacionais, e que, no ano passado, verificou que “estavam em sua grande maioria atrasados, com débitos vultosos acumulados” – referentes ao governo anterior.

Segundo o Ministério do Planejamento e Orçamento, os valores são pagos após um processo de apuração e verificação através de documentos e faturas que comprovem os débitos.

“Esses documentos devem então ser enviados ao MPO, que analisará o pedido de pagamento, a documentação e os limites orçamentários e financeiros vigentes. Assim, os valores são pagos ao longo do ano”, completou.

A pasta apontou, ainda, que “por vezes é necessário solicitar adequações orçamentárias em razão de variações cambiais, além do respectivo limite financeiro, podendo haver então alguma espera dentro do ano para conclusão do pagamento, que em geral não acarreta prejuízos ao governo, nem financeiros, nem de participação nos organismos”.



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