o pior ainda está por vir, prevê banco
Terceiro maior banco do país, o Bradesco costuma ser comedido em suas análises sobre a economia. O tom dos relatórios e declarações à imprensa tende a ser sóbrio, cauteloso. Não é o caso, porém, do boletim em que o banco anunciou a revisão de suas projeções para a inflação e o Produto Interno Bruto (PIB).
Desta vez, o texto do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos (Depec) não faz rodeios. Já nos primeiros parágrafos, afirma que:
“Sem perspectiva de ajustes adicionais, o país segue desancorado, na essência do que o termo representa.”
Isso significa que os preços de ativos – câmbio, ações, juros futuros etc – “respondem substancialmente a cada nova informação do cenário”. Sobem e descem ao sabor do vento e das correntes. Uma notícia mais ou menos ruim já é capaz de mandar cotações lá para baixo. E o oposto.
“Os próximos meses marcarão a pior combinação entre inflação e atividade dos últimos períodos.”
De acordo com o Bradesco, os índices de preços ainda responderão à desvalorização do real nos últimos meses, à inércia (ou seja, o efeito da inflação passada sobre os preços futuros) e “às surpresas com o crescimento”.
Por isso, o banco decidiu elevar sua projeção de inflação para 2025, de 4,9% para 5,7%. Bem acima do IPCA medido no ano passado (4,8%) e do teto da meta perseguida pelo Banco Central (4,5%), e um pouco além da mediana das apostas do mercado (5,5%). Se confirmado, será o pior número desde 2022.
Ao mesmo tempo em que a inflação sobe, o PIB perde vigor. O Depec diz que os sinais de desaceleração se acumulam e o fazem “ganhar convicção no quadro de recessão na segunda metade do ano”. “Apenas a agropecuária apresentará resultados consistentes”, diz o relatório.
Daí que a expectativa para o crescimento do PIB foi reduzida de 2,2% para 1,9%. Bem menos que o resultado de 2024 (o dado oficial não saiu, mas o banco calcula algo próximo de 3,4%) e ligeiramente abaixo da mediana do mercado (2,1%). Seria o pior resultado desde 2020, primeiro ano da pandemia.
Os economistas do Bradesco acreditam que o país ainda cresce bem neste primeiro trimestre, graças à safra agrícola, mas desacelera em seguida e entra em recessão na segunda metade do ano.
Ou seja: aparentemente, o ciclo de aumento da taxa básica de juros (Selic) – que já chegou a 13,25% ao ano, após quatro reajustes seguidos – finalmente esfriará a economia.
Na avaliação do Depec, o juro alto vai prejudicar o investimento produtivo, que vem de forte aceleração em 2024. O consumo das famílias ainda terá o suporte da massa salarial, mas deve avançar menos por causa de aumento do desemprego e menor expansão do crédito.
O Bradesco acredita que a Selic ainda vai subir mais 2 pontos porcentuais, chegando a 15,25% em meados do ano, para depois recuar um pouco e fechar dezembro em 14,75%.
O aperto deve continuar fazendo efeito em 2026, ano de eleição presidencial. Nesse caso, o Depec até revisou um pouco para cima a projeção de crescimento do PIB, de 1% para 1,3%. Ainda assim, seria o mais fraco do atual mandato de Lula. A previsão para a inflação no ano que vem, enquanto isso, foi de 3% para 3,4%, o que representaria o menor índice em oito anos.
(Para quem está chegando agora ao mundo das projeções econômicas, vale o aviso: elas estão sujeitas a erros, para mais e para menos. Um exemplo. Em sua última ata, ao comentar “sinais incipientes” de moderação no crescimento econômico, o Comitê de Política Monetária do Banco Central fez questão de notar: “No passado também houve dados que sugeriam desaceleração, percepção que foi revertida em meses subsequentes, refletindo apenas volatilidade nas séries, sem alteração na tendência de crescimento, que mostrou notável resiliência”. Feito o alerta, seguimos.)
Inflação, PIB, juros: dívida pública é o fator determinante do cenário, diz Bradesco
O fator determinante para o cenário construído pelo Bradesco é a trajetória da dívida pública. Como as contas públicas não saem do vermelho, ela vem subindo desde o início do governo Lula, ainda que o crescimento econômico mais alto que o esperado (em 2023 e 2024) e a venda de reservas internacionais (em dezembro passado) tenham impedido avanço maior.
O problema, mais que o tamanho da dívida ou o tanto que ela já aumentou, é que pouca gente fora do governo acredita que ela vai parar de subir tão cedo. Na projeção do Bradesco, a reação entre endividamento e PIB, de 76,1% ao fim de 2024, subirá para 80,3% neste ano e 85,9% em 2026.
“Enquanto não houver clara perspectiva para sua estabilização, os preços de ativos, as expectativas e a própria economia estarão sujeitas a forte volatilidade”, diz o banco.
O relatório diz que “o arcabouço fiscal até cumpriu o papel de trazer a despesa pública para o nível anterior ao da pandemia” e que “o impulso fiscal em 2025 será menor do que nos anos anteriores”.
Ainda assim, ressalta que a velocidade da consolidação “é percebida como insuficiente”, e que não há perspectiva de ajustes adicionais. Não mesmo: dias atrás, o presidente da República avisou que, no que depender dele, não haverá novas medidas. E disse que quem passou o ano falando em déficit deveria pedir desculpas ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Nesta quinta (6), voltou a culpar Roberto Campos Neto, ex-presidente do Banco Central, pelos males da economia.
Apesar disso tudo, o Bradesco decidiu manter a premissa de uma taxa de câmbio estável em R$ 6 por dólar até o fim de 2026. “Essa escolha também se apoia na hipótese de que o arcabouço fiscal será cumprido até o final do atual mandato, o que nos parece uma condição necessária, ainda que não suficiente, para que a taxa de câmbio possa de fato se estabilizar”, diz o relatório.
O mundo ficou mais imprevisível com Trump. Pior para quem não fez a lição de casa
Como não faz a lição de casa, o Brasil fica mais vulnerável ao que ocorre lá fora. E as notícias do exterior não são exatamente boas. As ameaças protecionistas e vaivéns tarifários de Donald Trump, contra inimigos e amigos, tornaram o cenário internacional “errático”, nas palavras do Bradesco.
“O aumento da incerteza pode implicar em menor crescimento da economia global, à medida em que as decisões de investimento das empresas são postergadas até que o cenário se torne mais claro”, diz o texto.
Com mais risco de inflação no curto prazo, por possíveis choques de oferta associados às tarifas de Trump, o banco passou a esperar menos cortes de juros nos EUA. O que não é bom para países emergentes como o nosso.