persistência põe cidades no topo do ranking



A persistência em projetos de longo prazo para fomentar o empreendedorismo em regiões turísticas e pequenas comunidades está rendendo frutos no Nordeste. Cinco municípios da região estão no topo do ranking nacional dentre os que mais criaram empregos com carteira assinada em microempresas na última década.

É o que mostra um levantamento exclusivo feito pela Gazeta do Povo com os dados de municípios com mais de 50 mil habitantes na Relação Anual de Informações Sociais (Rais) de 2011 e 2021. Para a pesquisa, foram consideradas exclusivamente microempresas – estabelecimentos de comércio ou serviços com até nove empregados ou indústrias de até 19 funcionários.

Projetos e boas práticas que contribuíram para esses resultados são retratados na série “Onde empreender tem vez”, que a Gazeta do Povo publicou ao longo desta semana.

Cada texto tratou dos destaques em cada grande região do Brasil. A Região Nordeste, tema desta reportagem, conseguiu se destacar no cenário nacional, em termos proporcionais. Os cinco municípios que ocupam o ranking regional e nacional são Vargem Grande (MA), Trairi (CE), Barreirinhas (MA), Tutóia (MA) e Acaraú (CE), todos com aproximadamente 60 mil habitantes cada um.

Onde o emprego em microempresas mais cresceu no Nordeste (cidades com mais de 50 mil habitantes; fonte: Rais/MTE e IBGE)

Município População Empregados em 2011 Empregados em 2021 Variação (%)
Vargem Grande (MA) 57.813 146 368 152,1
Trairi (CE) 56.653 213 521 144,6
Barreirinhas (MA) 63.891 361 807 123,5
Tutoia (MA) 59.927 208 439 111,1
Acaraú (CE) 63.556 283 539 90,5
Luís Eduardo Magalhães (BA) 92.671 4.005 7.460 86,3
Granja (CE) 55.170 218 401 83,9
Eusébio (CE) 55.035 2.622 4.719 80,0
Lago da Pedra (MA) 50.959 339 592 74,6
Barra (BA) 54.225 323 544 68,4

Em Barreirinhas, porta de entrada para o Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, o fomento ao empreendedorismo remonta a meados dos anos 2000. O empresário Alexandre Gustavo Ugarte, 62 anos, está na cidade há 19 anos com a empresa Espírito de Aventura.

“Vim para cá com foco no ecoturismo e turismo de aventura, em um momento que era do movimento nacional de regionalização do turismo. A gente idealizou um Roteiro Integrado, no início, desenvolvido pelo Sebrae, que depois foi aprimorado e virou a Rota das Emoções”, diz ele, a respeito do apoio do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas.

A pesquisadora Rossane Cardoso Carvalho, professora da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA),  já apontava para a importância dessa parceria em 2007, quando apresentou tese de doutorado sobre o turismo na região. “Este órgão tem buscado orientar os trabalhadores a se organizar em cooperativas e associações e a buscar melhorias em seus produtos e serviços, como é o caso do artesanato, que, antes de um projeto desenvolvido pelo Sebrae com comunidades locais, tinha menor qualidade e falta de padronização”, diz o estudo.

Outro movimento importante para o turismo local foi a criação de um voucher digital, que contribui na organização do fluxo turístico. “Ele serve como um controle de visitação, principalmente dentro do Parque Nacional. Assim conseguimos saber quantas pessoas foram para a Lagoa Azul ou a Lagoa Bonita, por exemplo, e no fim do mês fazemos uma estatística e definimos qual estratégia de marketing será usada para incentivar mais algum destino”, conta Ugarte, que faz parte do Conselho Municipal de Turismo (Comtur) de Barreirinhas.

O projeto do voucher digital de Barreirinhas – que não criou taxa de visitação, apenas regulou o recolhimento de impostos sobre a atividade turística – foi o vencedor nacional da categoria Inovação e Sustentabilidade da décima edição do Prefeito Empreendedor (2017-2019), iniciativa do Sebrae para destacar políticas públicas com papel relevante no apoio ao empreendedorismo.

A descrição do projeto diz que ele “aumentou a quantidade de negócios formais regularizados no município; fortaleceu o cooperativismo e o associativismo; aumentou a arrecadação; gerou informações para a gestão de programas e ações da prefeitura para estimular o turismo”, além de ter proporcionado a formalização da associação das agências locais de turismo.

Conforme os dados de emprego da Rais, Barreirinhas conseguiu passar de 361 para 807 empregos em microempresas entre 2011 e 2021, alta de 124%, a terceira maior do Brasil. Para Alexandre Ugarte, o associativismo e formalização contribuem para o turismo sustentável. O Comtur tem atuado para difundir o turismo de base comunitária, em que as trilhas e passeios incluem vivências nas comunidades tradicionais locais, que mostram e vendem artesanato, culinária e outras práticas culturais.

“O empoderamento da comunidade local contribui para a fixação no território e sustentabilidade do ambiente natural. Se não há opção de renda, as pessoas vão embora e o turismo especulativo chega, e o território perde sua identidade e pode ser danificado com a exploração predatória. Então o turismo de base comunitária é um grande trunfo, faz parte de um planejamento estratégico para garantir a manutenção do turismo”, explica Ugarte.

Segundo Allison David Martins, gerente-executivo no Escritório de Estudos Econômicos (Etene) do Banco do Nordeste, a região tem se beneficiado de uma diversificação de investimentos, que permitem a cada setor crescer em regiões específicas.

“O turismo tem apresentando recordes de resultado, contribuindo para vários estados, mas há vários vetores de crescimento, como o agronegócio, que chega forte no interior do Maranhão, Piauí e oeste da Bahia, e algo mais recente, que é o investimento em hidrogênio verde, que deve movimentar bastante a indústria”, enumera.

O economista destaca que as grandes capitais nordestinas ainda concentram a maior parte dos investimentos, e que a aglomeração populacional cria ambientes propícios para o empreendedorismo. “Mas no interior do Nordeste temos visto um fenômeno bem interessante, que é das médias cidades, principalmente da Bahia, Pernambuco, Paraíba, Ceará e Maranhão, apresentarem crescimento grande”, observa.

Um desafio para o interior do Nordeste é viabilizar a infraestrutura necessária para um crescimento ordenado e sustentado, diz Martins. “Muitos municípios tentam fazer mais, nem sempre conseguem. Mas se observa que políticas governamentais dos estados e da União conseguem fazer uma interiorização do desenvolvimento econômico, como ocorreu com a expansão das universidades e institutos federais”, acrescenta o economista. Segundo ele, a política de interiorização do conhecimento foi muito importante para ajudar no crescimento estruturado.

Feiras e eventos serviram de vitrine para novo empreendimento

Em Vargem Grande (MA), o que contribuiu para o crescimento da Braseiro Linguiças Gourmet foram feiras e eventos promovidos pelo poder público e Sebrae, como a Rural Tur, realizada na Paraíba, e o 1.º Festival Maranhense da Cachaça, ambas em 2022.

“Estivemos em outros estados a convite do Sebrae e também em partes do interior do Maranhão que não conhecia. É uma ótima forma para apresentar os produtos para um público maior”, diz o empresário Ricardo Carneiro, 33 anos.

A empresa foi desenvolvida durante a pandemia, quando ele começou a produção por hobby em um sítio da família. Os amigos gostaram tanto que quiseram encomendar, e ele foi estruturando a produção. Hoje ele tem uma microindústria com quatro funcionários, para atender clientes em cerca de 20 municípios.

Carneiro aprendeu as técnicas de forma autodidata, mas agora participa de cursos e projetos como o Sebraetec, que subsidia projetos de inovação e tecnologia por todo o Brasil.

“Estamos em processo de registro de selo de inspeção estadual para comercializar em grandes lojas, e isso tem todo um custo, além de demandar reforma na fábrica. Com o Sebraetec uma parte é subsidiada e o restante a empresa banca, uma grande ajuda”, conta o empreendedor, que contribuiu para os números de emprego de Vargem Grande. Entre 2011 e 2021, o número de vagas em microempresas passou de 146 para 368. O crescimento, de 152%, foi o maior do país entre municípios com mais de 50 mil habitantes.

Esta é a quinta reportagem da série “Onde empreender tem vez”, que mostra as boas práticas dos municípios onde o emprego em microempresas mais cresceu na última década. Clique aqui para ler a série completa.



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