taxa Selic x taxas bancárias



Os juros cobrados do consumidor chegam a ser 40 vezes maiores do que a taxa básica, a Selic, que está atualmente em 10,5% ao ano. O mais alto é o juro médio do rotativo do cartão de crédito para pessoas físicas, de 429,5% ao ano, segundo o dado mais recente do Banco Central, de junho.

Hoje em 10,5% ao ano, a Selic é a terceira maior taxa básica real (descontada a inflação) do mundo, abaixo apenas da Turquia e da Rússia, de acordo com o site MoneYou. Em termos nominais (incluindo a inflação), a taxa brasileira é a sexta maior, atrás de Turquia, Argentina, Rússia, Colômbia e México.

Os juros das instituições financeiras são bem mais altos. Mesmo atingindo o menor nível em dois anos, a taxa média cobrada de pessoas físicas foi de 32% ao ano em junho, segundo o BC. Para as empresas, o custo médio do dinheiro é de 18,5% ao ano.

Modalidades de crédito com algum tipo de garantia superam mais de duas vezes a Selic. Em junho, o custo financeiro médio para a aquisição de veículos estava em 25,5% ao ano. O crédito consignado em folha de pagamento para aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) era de 21,4% ao ano.

As modalidades sem qualquer tipo de garantia, acessíveis a mais consumidores, são as mais caras. Em junho, o cheque especial para pessoas físicas estava, em média, em 135% ao ano, o maior índice desde dezembro de 2019.

Selic elevada se reflete na taxa de juro cobrada de consumidores e empresas

Um dos fatores que elevam os juros para consumidores e empresas no Brasil, segundo Samuel Pessôa, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), é o ponto de partida: a taxa Selic, que serve de referência para as demais.

Questões conjunturais contribuem para que ela esteja em 10,5%. A preocupação com a inflação tem ganhado destaque nas discussões sobre juros pelo Comitê de Política Monetária (Copom), tanto em relação ao índice atual quanto às expectativas. Nos últimos 12 meses encerrados em julho, a inflação medida pelo IPCA foi de 4,5%, a mais elevada desde fevereiro.

As expectativas de inflação estão cada vez mais distantes da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que é de 3%, com um intervalo de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos. O ponto médio das projeções consolidadas no boletim Focus, divulgado pelo BC, indicava no início do ano um IPCA de 3,9%. Nesta segunda (12), subiu para 4,2%. As expectativas para 2025 saltaram de 3,5% para 3,97%.

Segundo Ahmed El Khatib, coordenador do Centro de Estudos em Finanças da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap), o Brasil enfrenta um problema crônico de alta nos preços. “A inflação elevada leva a uma maior taxa Selic, o que encarece os juros cobrados ao consumidor.”

Os preços ao consumidor no Brasil aumentaram 203,8% entre 2004 e 2023, de acordo com dados do Fundo Monetário Internacional (FMI). Esse índice é superior ao de outras economias relevantes da América Latina, como Chile, Colômbia, México e Peru.

A alta temperatura no mercado de trabalho, caracterizada pelo menor desemprego em quase dez anos, pela elevada demanda em alguns setores e pelos reajustes salariais acima da inflação há 19 meses, também impede a retomada da queda nos juros, além de deixar aberta a possibilidade de elevação.

Gabriel Galípolo, diretor de Política Monetária do BC e principal cotado para assumir a presidência da instituição no próximo ano, afirmou em evento na segunda-feira (12) que uma eventual elevação da Selic “está na mesa” do Copom.

“Com os números de julho, a inflação cheia de serviços chega a 5,01% no acumulado de doze meses. A menor sensibilidade desse componente continua sendo um desafio para o BC, que vê a desinflação diminuir sua trajetória de convergência para a meta, enquanto a economia se mantém aquecida, com um mercado de trabalho dinâmico e maior rendimento real médio”, diz José Alfaix, economista da Rio Bravo Investimentos.

Brasil tem o terceiro maior spread bancário do mundo

O Banco Mundial aponta que, em 2023, o Brasil tinha o terceiro maior spread bancário do mundo, atrás apenas do Zimbábue e de Madagascar. Em termos anuais, a diferença média entre o que o banco paga para captar dinheiro e o quanto ele cobra do cliente era de 31,5 pontos percentuais.

Para o BC, os números são menores: o spread médio das operações bancárias era de 19,7 pontos percentuais no fim do ano passado e caiu para 18,4 em junho, o menor em dois anos.

A inadimplência é um dos fatores que mais pesam. Dados do BC indicam que a influência na formação do spread bancário passou de 26,6% em 2021 para 35,7% em 2023. No mesmo período, o peso das dívidas não pagas subiu de 2,3% da carteira do sistema financeiro para 3,2%, o mesmo índice registrado em junho.

Segundo Samuel Pessôa, outros fatores que influenciam significativamente na formação do spread bancário são a elevada carga tributária, o percentual dos depósitos compulsórios – dinheiro que o banco não pode emprestar aos clientes – e a grande quantidade de crédito direcionado a segmentos com juros subsidiados, como o imobiliário e o agronegócio.

O BC tem detectado uma pequena redução na importância dos tributos sobre o custo do dinheiro. O peso caiu de 22,9% do spread em 2021 para 21,9% em 2023.

O crédito direcionado representava 41,8% do saldo total das operações do sistema financeiro em junho, 1,5 ponto percentual acima do registrado em janeiro de 2023, mês da posse de Lula.

Custo das garantias e dificuldade de recuperar crédito pressionam juros

Outro problema destacado por Pessôa são os elevados custos de garantia e a dificuldade da Justiça em recuperar as garantias. Um estudo realizado em 2020 pelo Banco Mundial apontou que a taxa média de recuperação de ativos no Brasil era de 18,2 centavos por dólar emprestado, exigindo quatro anos e um custo de 12% do ativo.

Essa situação coloca o Brasil abaixo da média dos países da América Latina e do Caribe. Naquela época, a taxa de recuperação na região era de 31,2 centavos por dólar, exigindo 2,9 anos, embora com um custo maior, de 16,8% dos ativos.

Uma iniciativa que pode ajudar a reduzir esses custos é o Marco Legal das Garantias. A proposta, apresentada durante o governo Jair Bolsonaro (PL) e “abraçada” pelo atual ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foi aprovada pelo Senado em julho de 2023 e pela Câmara, em versão final, em outubro do mesmo ano.

O objetivo é destravar o mercado de crédito. O marco estabelece uma série de novas regras para ampliar a concessão de empréstimos com garantias, além de melhorias na segurança e execução extrajudicial de dívidas.

Sistema financeiro brasileiro ainda é concentrado

A baixa concorrência no sistema financeiro também contribui para a alta taxa de juros para famílias e empresas. “A falta de competição resulta em um spread bancário elevado”, diz El Khatib.

O peso das quatro maiores instituições (BB, Bradesco, Caixa e Itaú) no total de ativos do sistema financeiro vem caindo lentamente, de acordo com dados do BC. Em 2021, elas representavam 56,1% do total, enquanto no ano passado caiu para 55,3%. A participação no total de depósitos diminuiu de 59,7% para 57,9% e nas operações de crédito, de 58,9% para 57,8%.

O pesquisador do FGV Ibre acredita que a concorrência no sistema financeiro deve aumentar nos próximos dez anos. Ele destaca que as barreiras de entrada diminuíram com a chegada das fintechs. “Não há mais necessidade de investimento em agências fixas”, ressalta.

O Relatório de Economia Bancária, divulgado pelo BC em junho, aponta sinais de queda na concentração, com o aumento da participação de cooperativas de crédito e de instituições não bancárias. Essas organizações estariam atuando mais intensamente nos segmentos de cartão de crédito e crédito sem consignação, enquanto as cooperativas atuam nos mercados de cheque especial e capital de giro.

“Em 2023, houve um aumento no número de instituições financeiras ofertantes de capital de giro, crédito pessoal sem consignação e cheque especial”, destaca o relatório.

O documento também ressalta que o nível de concentração permanece elevado nos financiamentos rurais, habitacionais e nos de infraestrutura e desenvolvimento, cujos recursos são predominantemente direcionados.



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