Zanin pede vista e STF suspende julgamento sobre trabalho intermitente
O ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu vista e interrompeu o julgamento de três ações que questionam a validade do contrato de trabalho intermitente, criado pela reforma trabalhista de 2017. Com o placar temporário de três votos a dois, o julgamento ocorria no plenário virtual e estava previsto para terminar até 13 de setembro.
As ações foram movidas pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI) e por federações de empregados em postos de combustíveis (Fenepospetro) e trabalhadores de telecomunicações (Fenattel). Elas alegam que o contrato intermitente precariza as relações de trabalho.
O contrato intermitente permite que o empregado trabalhe apenas em períodos específicos, alternando entre prestação de serviço e inatividade. O valor da hora trabalhada é previamente estabelecido em contrato e não pode ser inferior ao salário-mínimo.
O contrato de trabalho intermitente, no entanto, é visto por críticos como uma forma de flexibilização excessiva, enquanto que defensores afirmam que formaliza trabalhadores que atuavam na informalidade.
O ministro André Mendonça foi o último a votar antes da suspensão e se posicionou a favor da legalidade do contrato intermitente. Segundo ele, essa forma de contratação “pode ser uma opção intermediária entre a informalidade, que não oferece garantias, e o emprego formal, que oferece menos flexibilidade” e garante ao trabalhador direitos como repouso semanal remunerado, férias e 13º salário proporcionais.
Esse entendimento também foi defendido pelos ministros Kassio Nunes Marques e Alexandre de Moraes, que votaram favoravelmente à manutenção dessa modalidade de contrato, totalizando três votos a favor.
No entanto, os ministros Edson Fachin, relator das ações, e Rosa Weber, que se aposentou no ano passado, declararam a inconstitucionalidade desta modalidade de contrato. Fachin argumentou que, embora a Constituição não proíba expressamente esse mecanismo, a reforma trabalhista não oferece as garantias necessárias para proteger os direitos fundamentais dos trabalhadores, especialmente o direito a uma remuneração mínima.
Desde a criação, o contrato intermitente tem sido alvo de críticas por parte de entidades sindicais, que o classificam como uma forma de precarização do trabalho. Por outro lado, representantes do setor produtivo afirmam que a modalidade oferece maior flexibilidade para as empresas, especialmente em atividades sazonais ou que demandam maior adaptação ao mercado.
De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os contratos intermitentes representam apenas 1% dos trabalhadores formais no Brasil, em um universo de aproximadamente 100 milhões de pessoas ocupadas. Eles são mais comuns em setores como atendimento, construção civil, cozinha e vendas.
O número de ações trabalhistas questionando essa modalidade de contrato cresceu 116% entre 2021 e 2023, segundo o Ipea. Apesar da alta, especialistas ouvidos pelo jornal Gazeta do Povo acreditam na constitucionalidade do contrato intermitente.
Victor Emmanuel P. Gallo B. de Souza, advogado do Abagge Advogados, afirma que essa forma de contratação formalizou profissionais informais e freelancers, garantindo a eles o pagamento proporcional de direitos trabalhistas como previsto pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
“É inegável que o objetivo dessa modalidade de trabalho foi justamente o oposto do que se argumenta nas ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs). Ela trouxe para o âmbito legal uma realidade que antes era totalmente desregulamentada”, diz.
Liane Garcia, outra especialista ouvida, compartilha da mesma opinião e vê no contrato intermitente uma oportunidade para empresas se ajustarem às demandas do mercado, especialmente em setores que dependem de trabalho sazonal. Ela acredita que a flexibilização das relações de trabalho, impulsionada por novas tecnologias como o home office e o trabalho em regime de tempo parcial, é uma tendência mundial que o Brasil precisa acompanhar.
Parte dessas mudanças, segundo Souza, já está sendo absorvida pelo Judiciário brasileiro. Ele cita como exemplo a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324, que reconheceu a legalidade da “pejotização”, antes amplamente criticada.